Dedução Integral de Despesas com Educação para Dependentes com Autismo no Imposto de Renda: Entenda a Decisão do Tema 324
- Adriana Monteiro da Silva
- 6 de out.
- 4 min de leitura
Uma importante decisão judicial trouxe um alívio significativo para famílias de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e outras deficiências, garantindo um direito fundamental no que diz respeito à declaração do Imposto de Renda (IR). A Turma Nacional de Uniformização (TNU) dos Juizados Especiais Federais, através do julgamento do Tema 324, pacificou o entendimento de que os gastos com instrução de pessoas com deficiência podem ser integralmente deduzidos como despesas médicas, mesmo que o dependente estude em uma escola regular.
O melhor é que esta decisão retroage 5 (cinco) anos e, caso você tenha declarado gastos com educação particular de pessoa com deficiência nos últimos 5 (cinco) anos, você pode requerer judicialmente a restituição dos valores corretos, de acordo com a nova decisão.

Estamos falando de uma grande vitória para a inclusão e um reconhecimento das necessidades específicas que envolvem a educação de pessoas com deficiência. Neste artigo, explicamos de forma clara e direta o que essa mudança significa e como os contribuintes podem exercer esse direito, a partir de agora.
O Cenário Anterior: A Limitação da Receita Federal
Até esta decisão, a Receita Federal impunha uma distinção que gerava grande ônus financeiro às famílias. As despesas eram categorizadas da seguinte forma:
•Despesas com Educação: Sujeitas a um teto de dedução anual, que para o ano-calendário de 2023, por exemplo, era de R$ 3.561,50. Qualquer valor gasto acima desse limite não podia ser abatido do imposto.
•Despesas Médicas: Sem limite para dedução, permitindo o abatimento integral dos valores gastos.
O problema era que a Receita Federal considerava os gastos com escolas regulares, mesmo que adaptadas e inclusivas, como despesas de educação, aplicando o teto de dedução. A dedução integral só era permitida para pagamentos feitos a entidades de saúde ou instituições exclusivamente especializadas em assistência a pessoas com deficiência. Isso criava uma barreira fiscal para as famílias que optavam pela inclusão em ambientes de ensino regulares, uma prática incentivada pela legislação brasileira e por tratados internacionais.
A Decisão do Tema 324: Um Novo Paradigma
Em outubro de 2023, a TNU julgou o Tema 324 e firmou a seguinte tese, que uniformiza a jurisprudência nos Juizados Especiais Federais de todo o país:
"São integralmente dedutíveis da base de cálculo do Imposto de Renda, como despesa médica, os gastos relativos à instrução de pessoa com deficiência física, mental ou cognitiva, mesmo que esteja matriculada em instituição de ensino regular." [1]
Na prática, a decisão reconhece que, para uma pessoa com deficiência, a educação em um ambiente adequado às suas necessidades tem um caráter terapêutico e reabilitador, sendo essencial para seu desenvolvimento e qualidade de vida. Portanto, esses gastos transcendem a mera instrução e devem ser enquadrados como despesas médicas, que não possuem teto para dedução.
O impacto financeiro desta mudança é expressivo, como podemos ver na tabela abaixo.
Característica | Despesa de Educação (Regra Antiga) | Despesa Médica (Após Tema 324) |
Limite de Dedução | Teto anual (ex: R$ 3.561,50) | Sem limite |
Exemplo de Gasto Anual | R$ 36.000,00 | R$ 36.000,00 |
Valor Dedutível | R$ 3.561,50 | R$ 36.000,00 |
Impacto | Grande parte do gasto não é abatida, aumentando o imposto a pagar. | O valor total é abatido, podendo gerar uma economia ou restituição de quase R$ 10.000,00 (para alíquota de 27,5%). |
Como Exercer o Direito à Dedução Integral
Para garantir o benefício na sua declaração do Imposto de Renda, é fundamental seguir alguns passos e manter a documentação organizada:
1.Obtenha um Laudo Médico: Este é o documento mais importante. É necessário ter um laudo emitido por um profissional de saúde que ateste a deficiência do dependente, preferencialmente com a indicação do código da Classificação Internacional de Doenças (CID).
2.Guarde Todos os Comprovantes: Mantenha todos os recibos e notas fiscais emitidos pela instituição de ensino. Esses documentos devem conter o CNPJ da escola e a identificação clara do aluno.
3.Declare Corretamente: Na sua declaração de IR, lance os valores na ficha de "Pagamentos Efetuados" sob o código de despesa médica (por exemplo, código 21 para "Hospitais, Clínicas e Laboratórios no Brasil" ou 10 para "Médicos no Brasil", dependendo da natureza da instituição). No campo de descrição, seja específico: "Gastos com instrução em instituição de ensino regular de dependente com [tipo de deficiência], conforme tese do Tema 324 da TNU."
Um Ponto de Atenção: O Risco de Malha Fina
Apesar de a decisão da TNU ser um precedente judicial forte, ela não obriga a Receita Federal a mudar seu sistema de fiscalização de forma automática. Historicamente, a Receita adota uma interpretação mais restritiva da lei. Por isso, existe a possibilidade de a declaração ser retida em malha fina para verificação.
Caso isso ocorra, não se preocupe. Você será notificado para apresentar a documentação comprobatória. Nesse momento, você deverá enviar o laudo médico, os comprovantes de pagamento e uma petição simples citando a decisão do Tema 324 da TNU como fundamento para a dedução integral. Se a Receita Federal ainda assim negar o direito, é recomendável buscar orientação jurídica para ingressar com uma ação judicial, que tem altas chances de sucesso com base neste precedente.
Conclusão
A decisão do Tema 324 é um marco para a dignidade e a inclusão, representando um alívio fiscal justo e necessário para milhares de famílias. Ao reclassificar os gastos essenciais com educação inclusiva como despesas médicas, o Judiciário corrige uma distorção e garante que a inclusão não seja penalizada pelo fisco.
Organize sua documentação, declare seu direito e, se necessário, busque apoio para garanti-lo. Esta é uma conquista que reforça o compromisso da sociedade com a proteção e o desenvolvimento integral de todas as pessoas.
Referências
[1] Conselho da Justiça Federal (CJF). "Tema 324". Disponível em: https://www.cjf.jus.br/cjf/corregedoria-da-justica-federal/turma-nacional-de-uniformizacao/temas-representativos/tema-324
[2] Jusbrasil. "Dedução Integral das Despesas com Educação de Dependentes com Autismo no Imposto de Renda". Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/deducao-integral-das-despesas-com-educacao-de-dependentes-com-autismo-no-imposto-de-renda-um-direito-garantido-pela-justica/3018264170
[3] Jurídico Certo. "Gastos relativos à instrução de pessoa com deficiência são integralmente dedutíveis do IR". Disponível em: https://juridicocerto.com/p/liviapinaffo/artigos/gastos-relativos-a-instrucao-de-pessoa-com-deficiencia-sao-integralmente-dedutiveis-do-ir-7162
[4] Migalhas. "Despesas escolares de dependente com deficiência são dedutíveis no IRPF". Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/440351/despesas-escolares-de-dependente-deficiente-sao-dedutiveis-no-irpf